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russomanias

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Um português de "jeans" em Moscovo

Janeiro de 1984, Moscovo. Estradas e passeios cobertos de neve. Um frio de rachar, com mais de vinte graus negativos. Bem fiz eu em seguir os conselhos de um meu amigo e comprar uma "chapka", uma espécie de boné russo com extensões para tapar as orelhas, feito de pele de coelho. Acertei também em trazer umas boas botas capeadas com borracha, pois com capas de couro seria de morrer, com a humidade gelada a subir-me pelas pernas acima. Moscovo é uma cidade enorme, com avenidas gigantescas, fria e sem o aspecto das cidades europeias ocidentais, desde logo pela escassez de estabelecimentos comerciais onde se possa comprar as habituais bugigangas ou tomar um chã ou café em cada esquina. Claro que tem restaurantes bons e maus como em qualquer outro lado, e até de luxo, mas para isso é preciso conhecer alguem que domine a cidade. Um amigo levou-me a um desses restaurantes populares situado numa cave meio escondida, atravessado por uma barulheira enorme e frequentado pelos residentes locais, sempre atentos à presença de sofisticados estrangeiros. Foi aí que provei  o arenque fumado à maneira russa, acompanhado de uma enorme caneca de cerveja. Gostei e ainda hoje perco a cabeça com peixes fumados.

 

Ir a Moscovo sem ver o Kremlin é o mesmo que ir a Roma e não ver o Papa. Lá fui eu então ver o ícone do poderio soviético, com as suas muralhas vermelhas muito bem conservadas. Lá estavam o mausoléu de Lenine, a majestosa Catedral ortodoxa de S. Basilio, imponente e belíssima, de cores muito vivas e cúpulas douradas, os famosos Armazéns GUM, onde se podia comprar quase tudo mas se não tivessemos moeda forte estrangeira não compravamos quase nada. Admirava-me muito com toda aquela gente que calcorreva Moscovo, estrangeiros por todos os lados, diversos povos dos mais distantes lugares dos confins do império, russos, kazaques, arménios, tadjiques, moldavos, turcomanos e tantos outros. As mulheres russas davam de sobremaneira nas vistas, com os seus fabulosos casacos de peles, que, acrescidos à sua natural beleza, mais as realçava. 

 

Andar no Metro de Moscovo é uma experiência incrivel, com todas aquelas linhas sobrepostas e estações maravilhosamente ornamentadas, autênticas obras de arte.

 

Ir a Moscovo e não comer caviar é o mesmo que ir a Paris e não comer paté de pato. O mais caro é o caviar preto mas, à falta de dolares ou marcos, vai mesmo do vermelho, mais barato mas igualmente bom, pelo menos para mim, que não sou esquisito. E é que não sou mesmo, pois até me dei à experiência de provar e finalmente comer várias vezes a famosa "kaxa" russa, uma espécie de papas de aveia.

 

Muito me admirei de ver a circular em Moscovo centenas e centenas de camiões a carburar gasolina e não gasóleo, muito mais barato. Mas será que esta gente anda a nadar assim tanto em petróleo? Pelos vistos andava mesmo. Outra coisa que demorei a compreender foi o extraordinário interesse dos jovens soviéticos pelas famosas calças de ganga ocidentais, a nossas "jeans", como as minhas, pelos vistos uma autêntica raridade por aqueles lados. Os soviéticos não tinham qualquer dificuldade em fabricar os mais complexos misseis intercontinentais, os mais que gigantescos submarinos atómicos e os mais sofisticados satélites... fabricar "jeans" é que era para eles uma dificuldade, pois que, diziam, corrompia a juventude. Muito honesta e sinceramente... não percebi esta preocupação com as "jeans" ocidentais, mas também não fazia mal, o passeio estava a chegar ao fim.

 

Para se gostar então de Moscovo era necessário gostar de viajar e contactar todos os dias com pessoas e experiências novas, e eu sempre gostei muito. Para alem do mais, sempre suscitaram a minha admiração os autores russos do "Taras Bulba" e de "Os Irmãos Karamazov"... e eu suspirava por um pouco desse ambiente admirável, mesmo que só aproximado e alterado em muito pelo terramoto de 1917.

 

Até à próxima, pátria de Gogol e Dostoievski... até à próxima!...

          

          

Dicionário de Política para Tótós - de A a Z

BARÍTONO - Barítono é um cantor masculino de voz intermédia, geralmente situado entre um baixo e um tenor. É uma voz mais grave  e melodiosa que a dos tenores, sem possuir contudo a mesma agilidade. São sobejamente conhecidas situações de pintores, pianistas, seminaristas ou outros "artistas" falhados que no decorrer da história se meteram na política como forma de compensar a sua desilusão artistica, e nós em Portugal também tivemos e temos os nossos artistas falhados tentando de novo a sua sorte nos meandros do poder. Desta vez saiu-nos um ex-barítono como primeiro ministro, pelo que aqui, como nos outros casos, a factura a pagar pela maioria da população tem sido bem pesada. 

 

No início, antes de chegarem ao poder, quando estão na oposição, os barítonos apresentam-se com uma voz bem melodiosa, afetuosa, terna, doce, macia, meiga, tentando convencer-nos, na Assembleia da República e na TV, de que, eles sim, não são como os outros, mas bem diferentes, pois não estão nem nunca estarão de acordo com a austeridade, nunca aumentarão os impostos, nunca tocarão nos rendimentos dos reformados e pensionistas, nunca despedirão funcionários públicos, nunca atacarão o Serviço Nacional de Saúde para beneficiar os hospitais privados, que são pessoas com ética, cumpridoras das suas obrigações fiscais e acima de qualquer suspeita.

 

Mas, chegados ao poder, que cantilena nos tangem os ditos barítonos? Austeridade a toda a força, aumento brutal de impostos, ataque assustador aos rendimentos dos reformados e pensionistas, funcionários públicos empurrados pela porta fora, redução contínua do Serviço Nacional de Saúde, com fecho continuado de serviços hospitalares, despedimento de milhares de enfermeiros, encerramento de postos médicos e Tribunais. Quanto à ética de um barítono, pelo que se referiu acima, é melhor nem falar, o mesmo se dizendo quanto ao cumprimento das suas obrigações fiscais, como qualquer cidadão comum. Transformar manifestos salários de cinco mil euros mensais em "despesas de representação" para enganar o Fisco é manobra digna de alguém que não merece ser chamado de cidadão... muito menos de primeiro ministro de um país a ferro e fogo com a austeridade e debaixo de uma feroz ditadura fiscal.

 

Por isso, meus caros concidadãos, muito cuidado, muito cuidado mesmo com algumas vozinhas melodiosas, afetuosas, ternas, doces, macias e meigas de alguns barítonos que pululam em redor do cadeirão do poder, é que, não lhes dar ouvidos é sempre a melhor solução e um meio seguro para ocasionar... a morte política do habilidoso "artista".

 

 

 

 

 

 

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O fiel jardineiro da Quinta da Boeira

Quem desce a Rua Teixeira Lopes, em Gaia, vindo do Largo dos Aviadores, depara-se, sensivelmente ao meio da rua, do seu lado esquerdo, com a conhecidíssima Quinta da Boeira, que em meados dos anos sessenta e até à alguns anos atrás, pertenceu a uma família de ingleses proprietária dos famosos armazens de vinhos Porto Taylor's. Meu pai, por essa altura, nesses anos difíceis para quem vivesse unicamente dos rendimentos do seu trabalho, labutou como jardineiro nessa famosa quinta. Fazia aí, juntamente com outros jardineiros, todos os trabalhos inerentes a uma propriedade já com algum porte, trabalhos que poderiam ir desde o tratamento de um simples quintal até à poda de árvores e tratamentos de relvas. Como toda a gente sabe, os ingleses adoram estufas de flores e o meu pai, muito habilidoso na matéria, foi incumbido pela esposa do proprietário de fazer a sua respectiva manutenção e replantação anual das mais variadas plantas e flores. Mal o meu pai lhe colocou as mãos em cima, a estufa começou a brilhar e a reflectir uma vitalidade que a todos encantava, sobretudo à senhora inglesa, esposa do proprietário. O meu pai selecionava os bolbos da futuras plantas, mudava contantemente os vasos nas alturas certas, regava com arte e sabedoria, dando um jeito à ponta da mangueira para que a água caisse nas plantas com suavidade e carinho, falava com as flores, sim, meu pai dizia que era necessário falar com as plantas e muitos outros truques mais que só ele na quinta sabia e dominava, como estrumar determinadas flores e plantas com urina, sim urina. A acrescer a tudo isto, meu pai era um jardineiro extremamente limpo e, também por isso, todas as pessoas para quem trabalhava gostavam dele. Se não acabasse o serviço que andava a fazer no mesmo dia, tinha contudo a preocupação de varrer tudo e deixar o jardim limpo e asseado. Gostava do que fazia, e era tudo.

 

Um dia meu pai dirigiu-se à senhora e explicou-lhe que fazia todos os trabalhos da quinta como os outros colegas e que, para além disso, cuidava da estufa, trabalho que, para além do meu pai, mais ninguem sabia fazer. Achava meu pai, então já com quatro ou cinco filhos para sustentar, que a senhora bem poderia dar-lhe um ligeiro aumento de ordenado, para o compensar do esforço extra que fazia com a estufa. A senhora disse redondamente que não, que se lhe aumentasse o ordenado a ele também teria que fazer o mesmo aos outros. E que, para além do mais, disse a senhora, trabalhava lá na quinta um outro jardineiro que lhe viera já dizer que sabia tratar tão bem da estufa como ele, Adriano, e que o faria pelo mesmo ordenado que já ganhava. Continuou então meu pai a fazer todo o trabalho da quinta e também o da estufa mas, na melhor altura, despediu-se e foi trabalhar para outro lado, com um ordenado já bem melhor.

 

Passado um ano ou dois, a senhora inglesa da Quinta da Boeira mandou alguem contactar meu pai para que o mesmo se dirigisse à quinta para falar com ela. Meu pai lá foi falar com a senhora, que lhe pediu, encarecidamente, que voltasse a tomar nas suas mãos a estufa e cuidasse dela como só ele sabia, pois que... "desde que você, Adriano, se foi embora, nunca mais tivemos flores como quando você cá estava, e tudo na estufa murchou". Meu pai sorriu para a senhora inglesa e desculpou-se que não tinha tempo, pois entrava cedo todos os dias e saía tarde e, para além do mais, a estufa da quinta requeria um tratamento diário e se cuidasse dela só nos fins de semana não iria resultar na estufa de que a senhora tanto gostava de mostrar aos estrangeiros que visitavam a quinta várias vezes ao ano. A senhora não desarmou e tentou comprometer o meu pai no serviço, mas meu pai mais uma vez alegou que não tinha tempo e que, ou fazia bem o serviço da estufa ou, pura e simplesmente, nem lhe tocava. A senhora mais uma vez insistiu e instou meu pai a vir tratar da estufa diariamente, na hora do almoço da empresa onde trabalhava, que ficava perto. Era um esforço descabido para o meu pai, que trabalhava lá na empresa com tarefas bastante pesadas e necessitava do máximo de descanso. Mas, por artes e promessas de bom pagamento, a senhora lá convenceu meu pai a fazer diariamente um "biscate" na hora do almoço e novamente meu pai, passado pouco tempo, colocou a estufa da senhora inglesa a brilhar e a encher a mansão da quinta com as mais belas flores que se possa imaginar. Mas a história não ficou por aqui.

 

A senhora, passado uns meses, confrontou meu pai com o, no seu entender, exagerado ordenado que lhe estava a pagar, dando a entender que era demasiado para um trabalho que não era assim tão difícil e não requeria conhecimentos assim por aí alem, e que até já tinha alguém em vista que lhe faria mais barato e igual. Meu pai parou de imediato o que estava a fazer e disse à senhora que a partir daquela altura não mais tocaria na estufa e que a senhora poderia contratar para a tarefa quem bem quizesse... e foi-se embora. Meu pai soube mais tarde, passado uns tempos, que a estufa nunca mais foi bonita e bem tratada como quando andava pelas suas mãos e que a senhora estava muito desgotosa com tudo isso. Mais tarde soube tambem que a outrora bela e resplandescente estufa estava simplesmente... abandonada.

 

Alguns anos passaram e, um domingo de manhã, um carro com motorista esperava meu pai à porta da capela dos Padres Redentoristas, que entretanto aí assistia à missa. O motorista vinha da parte da senhora inglesa da Quinta da Boeira, que pedia por favor e encarecidamente a meu pai que viesse urgentemente com o motorista à quinta para dirigir e supervisionar a confecção de palmas de flores, como só ele sabia fazer e eles não conseguiam, para o funeral do proprietário inglês da quinta, que entretanto havia falecido. O meu pai lá foi urgentemente a correr fazer aquilo que ele mais bem sabia fazer... tratar e falar com flores.

 

Decorridos uns anos, ainda hoje tento aprender a falar com flores... mas acho que jámais o farei tão bem como o meu pai o fazia na famosa Quinta da Boeira.

Dicionário de Política para Tótós - de A a Z

BAJULADOR - Aquele que enaltece, que bajula, que elogia com fins geralmente interesseiros. Sem dúvida uma profissão política muito apreciada no Portugal actual, por representar um meio quase sempre seguro de, mais tarde ou mais cedo, permitir um bom e bem remunerado lugarzinho na Assembleia da República, numa Secretaria de Estado, num orgão de comunicação social, como administrador não executivo de um Banco, à frente de uma Misericórdia, como vereador municipal, como presidente de uma Junta de Freguesia, como director de um parque de campismo de uma autarquia, enfim, o acto de bajular alguma figura política considerada importante sempre ajudará o bajulador a ter mais qualquer coisinha na vida. E não é isso o que afinal interessa, ter mais alguma coisinha na vida?

 

Os bajuladores aparecem-nos por tudo quanto é lado. Pode ser um simples jornalista a fazer um rasgado elogio a um partido da área do poder, com o fim encoberto de ser chamado para um servicinho remunerado no próximo governo. Pode ser um militante do partido do punho fechado a lançar a fateixa ao partido da setinha, pois que lhe cheira que o seu partido vai cair e então, e o quanto antes, é urgente lançar a ponte para o rendimento chorudo que vislumbra nos próximos anos. Pode ser também um conhecido autarca que andou anos e anos a dizer mal da direcção do partido, sulista, elitista e liberal, e que, de repente, começou a dizer muito bem e a elogiar e a apoiar em tudo, porque precisava de colocar o filho na lista de deputados a eleger nas próximas eleições legislativas. Vocês estão a ver, o que custa fazer uns quantos e rasgados elogios, balofos e despropositados, se o prémio é encaixar o primogénito na corrida para o cadeirão do poder? Quais princípios, qual ética, qual carapuça, trata-se da corrida para controlar os milhões e milhões da máquina do Estado... e está tudo dito!...

 

Por isso, meus caros concidadãos, se querem ser alguém na vida bajulem, bajulem todo o figurão que vos apareça pela frente... e deixem-se de pruridos!...

          

A verdadeira austeridade... à maneira da minha rica avósinha!...

No tempo em que a minha rica avósinha era viva a austeridade era mesmo a sério... era todos os dias. Não era fartura de manhã e esbanjamento à tarde, era austeridade a toda a hora. Seis netos para alimentar era uma grande consumição e fortes dores de cabeça. E a austeridade não era para um neto ou dois... era para todos lá em casa, que com minha mãe, meu pai e minha avó somavamos nove. A austeridade de hoje em dia é só para alguns, para os que vivem do seu trabalho e das sua reformas, pois que esses que andam nessas TV's a propalar a austeridade estão bem resguardados e não prescindem das suas mordomias. Veja-se o caso do Ministro da Solidariedade e Segurança Social, o tal que chegou de "lambretta" e agora se passeia num confortável Mercedes. O homem não se satizfez em passar da "lambretta" para um Renault Clio ou para um Fiat Uno... não!... o homem teve logo que saltar, mal chegou ao Governo, de uma modesta "lambretta" para um espampanante e milionário carrão. Para quem é então a austeridade?... para o Zé pacóvio, claro!...

 

Não, no tempo da minha avósinha não era nada assim. Lembro-me muito bem do esforço que se fazia lá em casa para que o nosso estomago não andasse a dar horas, como eu via em tantos outros miúdos lá da rua. Tudo se aproveitava, todas as sobras guardadas para uma próxima refeição. Muitos dos pratos que eu hoje ainda adoro aprendi a gostar deles nesses tempos de rigorosa e diária austeridade. Era o bacalhau à espanhola, o bacalhau cozido, o bacalhau à Brás, o bacalhau à Gomes de Sá. Era a sopa de legumas, as torradas de sêmea com manteiga ao domingo de manhã, antes da missa. Havia também um aproveitamento de sobras que a minha avósinha fazia e que hoje, cá em casa, para além dos outros pratos, ainda faço. Trata-se do pastelão com brôa de milhouma iguaria parecida com a tortilha espanhola e que eu adoro. Aproveitavam-se as sobras de carnes, chouriços e batata cozida e cortava-se tudo aos bocadinhos, juntamente com cebola e salsa picada. Juntavam-se as sobras com a brôa de milho, esfarelada à mão, dentro de uma tijela, juntamente com a cebola e a salsa. Misturava-se tudo com cinco ou seis ovos batidos, gema e clara, e temperava-se com sal e um pouco de pimenta. Colocada a sertã ao lume e depois de devidamente aquecida, fazia-se como uma simples omelete, mas a toda a largura da sertã, como as tortilhas. Dava um triangulo para cada um dos netos... mas sabia a pouco. Humm... aviava já agora uma!...

 

Um dia desta semana vou lembrar os tempos de austeridade da minha rica avósinha com um pastelão com broa de milho, não só para alguns felizardos... mas para todos lá em casa.

          

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BARÃO - "As armas e os barões assinalados que, da Ocidental praia Lusitana..." (Os Lusíadas, de Luís de Camões). Já há muitos anos que temos Barões em Portugal, vindos já dos tempos da monarquia, onde ponteavam como grandes proprietários rurais e, por vezes, ocupando importantes cargos políticos. Os Barões de hoje em dia poderão ser igualmente grandes terratenentes como outrora, mas também grandes empresários nortenhos da indústria têxtil, de grandes orgãos de comunicação social, da indústria de construcão civil ou de poderosos grupos financeiros. Normalmente não aparecem à vista desarmada nem dão a cara, mas o que interessa é que são eles quem manda e quem decide os destinos deste país. Não importa quem vota a favor de quem ou contra quem nos grandes partidos, os Barões decidem e tudo se desenrolará segundo a sua vontade. Que o diga Luís Filipe Menezes, aquando da sua eleição para presidente do PSD, logo putativo candidato a primeiro ministro. Os barões do PSD não mais se esqueceram do Congresso de 1995 e o ataque impetuoso do nortenho Menezes ao eixo "sulista, elitista e liberal". Marcaram-no de prontinho e... zás!... quando Menezes pensava já que era uma verdadeira estrela e numa questão de tempo o poleiro do poder lhe cairia de caras nas mãos, os Barões do partido, na sombra, tiraram-lhe sorrateiramente o tapete e o coitado do homem estatelou-se estrondosamente no chão. Nas eleições autárquicas de 2013 o impetuoso Menezes, mais uma vez, lá tentou a sorte de chegar pelo menos ao cadeirão da Câmara do Porto, mas nem aqui alguns dos Barões do seu partido deixaram de actuar na sombra e o azarento e já marcado Menezes... pimba!... mais uma vez malhou, traído de novo. 

 

Convém nunca desprezar o poder efectivo dos Barões cá da terrinha... eles é que decidem e a Democracia é somente para constar da fotografia!...

 

 

 

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Torpedos e... Acordo Pornográfico

Consideremos uma frase do seguinte teor: "O Senhor Doutor Juiz considerou o facto como provado". Como interpretar a frase? No tempo em que eu andei na minha linda escolinha, só o poderia ser no sentido de que o Senhor Doutor Juiz deu o caso, o acto, o acontecimento como tendo ficado provado. E agora esta outra fase: "O Senhor Doutor Juiz deu o fato como provado". Eu e os outros meninos da escolinha diriamos logo que o Senhor Doutor Juiz deveria ter ido de certeza ao alfaiate provar o seu fato, conjunto de calça e casaco, e deu a entender ao artesão que considerava a prova feita. Costumava dizer-se até, "fui ao meu alfaiate provar o fato". Pois agora esta gentinha do acordo pornográfico, desculpem, ortográfico, decidiram vandalizar o português e, entre outras alhadas em que nos meteram, estipularam considerar que "facto" e "fato" são a mesma coisa, quando nós sabemos que não são, pois num caso significa acontecimento, caso, acto, e, no outro, vestuário, como conjunto de calça e casaco, no caso dos homens, ou saia e casaco, no caso das senhoras. Esta foi uma das calinadas, mas muitas outras se fizeram para agradar a interesses que nada têm a ver com a origem histórica da lingua portuguesa.

 

Que diriam Camões, Vieira, Camilo, Eça e Pessoa destes escrevinhadores sentados nas secretarias governamentais que decidiram prostituir a nossa lingua a seu bel prazer, somente para agradar aos interesses globalizadores dos "mensaleiros" do Palácio do Planalto?... Eça de Queirós de certeza que os escalpelizaria a todos!...

 

Ao não tomarmos medidas muito firmes e sérias, não vai demorar muito tempo e ouviremos um dos nossos filhos dizer para a sua "garota": "Meu bem, depois lhe enviarei um torpedo do meu celular". Este português macarrónico cheira-me a sopa estragada... "torpedo" no lugar de "mensagem", "celular" no lugar de "telemóvel".

 

Meu tio-avô duriense, verdadeiro português de gema, de linguagem viperina e crua, se fosse vivo, depois de um bom caldo de couve galega daria de certeza um belo e sonante traque a um desses paspalhões responsáveis pelo chamado acordo pornográfico, desculpem, ortográfico, terminando, satisfeito... "humm... mas que belo torpedo"!...

          

          

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AUTARQUIA - Autarquia ou orgão de poder local é uma e a mesma coisa. Poderá ser tanto uma Junta de Freguesia como uma Câmara Municipal. É interessante entrarmos e olharmos atentamente para dentro de qualquer autarquia, começando pela que fica mais perto da nossa porta. Não é nada difícil encontrarmos aí um porteiro qualquer, irmão de um conhecido jogador de futebol, com um ordenadão de se lhe tirar o chapéu, fazendo salamaleques e a indicar portas à direita e à esquerda, admitido sem se saber como. Ou então dar de frente com um fiscal do serviço de limpezas de uma Câmara qualquer que em anos anteriores havia sido presidente, desinteressadamente, de uma junta de freguesia pelo mesmo partido. Um administrativo que entrou para uma junta de freguesia pela mão do presidente, com o 9º ano, se o tivesse, e depois aparece como director de serviço com o 12º, sem nunca ter adquirido essa qualificação, também não é difícil encontrar. 

 

Todas as autarquias fazem concursos públicos de admissão de pessoal para os seus mais diversos serviços. Nesses concursos prestam provas dezenas ou centenas de pessoas que tiveram que fazer variadas despesas para se poderem apresentar a concurso. Foram despesas de deslocação, almoços fóra, dias de trabalho perdidos. Só que os lugares para que concorrem estão já preenchidos por filhos, sobrinhos e cunhados dos manda-chuvas da autarquia lá do sítio, e essas pessoas fazem ali apenas o papel de tótósinhos.

 

Cada quatro anos, se mudarem os patrões da autarquia, é um autêntico rodopio de caras novas. Mas então, perguntam alguns, os eleitos dos outros partidos não dizem nada, deixam-se levar?... boa pergunta!... mas o que acontece é que pouco ou nada há a fazer, e isto porque, de vez em quando lá se dá uma atençãozinha a um sobrinho de um conhecido figurão da oposição, e... de que estás à espera?... tudo fica em águas de bacalhau. Mas a situação pode bem tomar outros contornos. Se a oposição se der ao desplante de fazer muito barulho, então aí o que há a fazer é comprar um ou dois dos seus manda-bitaites com algum cargo "executivo" de separa-papeis ou então, aqui com mais cerimónia, manda-se atribuir a um deles a medalha de mérito municipal por serviço prestados ao fim de semana e fóra de horas... e o homenzinho cai que nem canja e deixa de fazer ondas e birras públicas à figura do senhor presidente.

 

Como se pode ver, as autarquias são um mundo... um mundo de interessante e descomprometida dedicação.

          

A insustentável subtileza da mais antiga deficiência do mundo

Já todos ouvimos falar na mais antiga profissão do mundo. E na mais antiga deficiência do mundo?... esta parece-me que raramente se fala dela, mas quer-me parecer que é tão antiga ou mais antiga ainda que a primeira. Ela aparece já descrita, vejam lá, no Livro Genesis do Antigo Testamento, e repararemos mais afincadamente nela se nos lembrarmos da história de Caim e Abel. O primeiro dos irmãos, Caim, matou Abel por razões de ciumeira e inveja e, a partir daí, a deficiência não mais deixou de ter relevo por andar muito associada às maiores paranóias mundiais. Ciúme, inveja, cinismo, ódio, histerismo, calculismo e não sei quantos mais ismos, costumam aparecer muito ligados e por vezes assustadoramente acumulados na mesma pessoa, pelo que, em conjunto, é de uma deficiência avassaladora.

 

Muitas vezes o cínico aproxima-se de nós muito subtilmente, tudo mesuras e elogios, mas por detrás de si está o calculismo, o ciúme, a inveja e finalmente o ódio. Já nos demos muitas vezes a perguntar porque será que tal ou tal pessoa nos odeia tanto, e nos questionamos sobre o mal que lhe teremos feito. Não lhe fizemos mal nenhum!... é a pessoa que somos e que ela gostaria de ser, é a namorada que temos e ela não tem, é o marido que temos e ela não conseguiu conquistar, é o sorriso que temos e ela nunca terá, são os filhos que temos e ela não soube fazer, são os amigos que temos e ela não conseguiu atrair, é o curso que temos e ela nunca quis queimar as pestanas a tirar... enfim... é o ciúme e a inveja a funcionar.

 

Mas o engraçado e extremamente perigoso é que esses e essas deficientes são sempre uns santos e umas santas. No seu estreito circulo de amizades cultivam ou esforçam-se por cultivar a imagem de pessoas bondosas e prestáveis, solícitas e mais puras que sua Santidade o Papa, incapazes da mais leve maldade ou dessimulado pensamento. Mas, com tanto teatro e esforço de dessimulação mental, por vezes os circuítos da placa entram em esforço e... zás!... salta-lhes a tampa e o trazeiro fica à mostra. É aí que os apanhamos, indefesos e sem justificação. Então entra em cena o histerismo, incapazes já de manter aquela imagem de santidade tão característica. Insultam então tudo e todos, o mundo é seu inimigo e já nada têm a perder. O ciúme e a inveja que os faz mover todos os dias vem então ao de cima... claros como a água, para toda a gente ver. Mas nem todos os veem, ou não querem ver, ou por interesse ou porque também padecem da mesma deficiência. Mas esses verdadeiros deficientes estão aí por toda a parte. Eles sentam-se ao nosso lado nos empregos, alguns são nossos vizinhos, estão nas escolas, na política, nas religiões... na nossa família. É uma verdadeira doença a ter em conta, a combater... porque inimiga declarada da felicidade dos outros.

Dicionário de Política para Tótós - de A a Z

AUTARCA - Costuma chamar-se autarca à pessoa que é eleita para uma Camara ou Junta de Freguesia através de eleições. Claro que, depois de eleito, qualquer autarca que se preze passará a ser conhecido como Doutor isto, Engenheiro aquilo ou até por simples patrão, pois que, na maioria dos casos, é da relação de patrão e empregados que vive a maior parte das autarquias.

 

Mal seja eleito, a primeira acção de todo o bom autarca é fazer rodear-se de criados e bajuladores da sua inteira confiança. Não é tão importante assim o nível de instrução ou a experiência dos que com ele privam e actuam. É importante sim que sejam uns ferrinhos do partido e submissos à sua própria pessoa. Mas se, para acomodar algum dos seus amigos, for necessário simular habilitações inexistentes ou convocar algum concurso para preenchimento de lugares que se encontram já preenchidos, nenhum problema, haverá sempre um amigo de confiança nas Novas Oportunidades e convoca-se de imediato 50 ou mais pessoas (tótós...) para o exame do concurso a fazer de conta.

 

Mal é eleito o autarca esperto e ladino tratará logo de dizer mal dos autarcas que o antecederam, a não ser que o poleiro já venha a ser ocupado por ele próprio desde anteriores eleições. Aí sim, estará tudo bem. É que convem salvaguardar-se, pois, como os anteriores não prestavam, tudo irá ser mudado, a começar pelos fornecedores e prestadores de serviços da autarquia, os quais, segundo ele, têm preços muito melhores e em mais aceitáveis condissões e, para além do mais, mas isso ele não diz publicamente, claro, com sobrefacturações muito mais rentáveis para encher o saco azul do partido ou o seu próprio saco pessoal.

 

É claro que o autarca publicamente não é nada disso, ele é, pelo contrário, uma pessoa sensível e preocupada com a comunidade. Por isso, todos os anos realizará uma viagem a Cuba com pessoas a necessitar de urgentes tratamentos médicos só aí disponíveis, durante uma ou duas semanas e, enquanto espera, sempre poderá retemperar do esforço, ele e as suas secretárias, nas belas praias de Varadero. Mas poderá também ir ao Brasil, de férias, durante três ou quatro meses ao ano, com pessoas da terceira idade lá da terra, tudo pago pela autarquia. Claro que o bom autarca aproveitará para montar tenda em Copacabana, Rio de Janeiro, igualmente acompanhado das suas secretárias ou acompanhantes de velhinhos, a bem do apoio desinteressado à terceira idade.

 

O desenvolvimento da sua cidade é uma das principais preocupações de qualquer bom autarca. Por conseguinte, necessário se torna estabelecer relações pessoais e especiais com os construtores e empresários, ajudá-los nos seus pedidos de licenças e projectos, tomar parte na apreciação dos riscos dos seus investimentos, tudo de uma forma cortês e desinteressada, pois, como é sabido, o mandato não durará para sempre e necessário se torna acautelar o futuro com umas boas contas em "offshores" ou um cargo de prestígio e bem remunerado numa empresa por si favorecida.

 

Claro que, no final, terminado o mandato, haverá sempre o risco de o autarca ser acusado de enriquecimento ilícito, de ter comprado um andar de luxo no Porto ou em Lisboa, ou uma quinta em Baião ou Marco de Canavezes. Mas isso, com os milhões acumulados no exterior a dar descanço e os amigos certos nos locais certos, tudo se resolverá. Processos judiciais, se os houver, levarão anos e, com recursos atrás de recursos dez anos é uma vida. Pagar a escritórios de advogados não será preciso pois estes já receberam antecipadamente quando foram contratados para a feitura das leis encomendadas pelo governo ou na defesa de pleitos em que são parte poderosas empresas públicas.

 

Ser autarca numa Junta de Freguesia ou, principalmente, numa Câmara Municipal em Portugal não é pois bom nem mau... é excelente!...

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